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domingo, 28 de março de 2010

Que saudade do Galvão!


Eu nunca imaginei que um dia iria dizer a frase do título deste post. Como a maioria dos brasileiros, não tenho muita paciência com o Galvão Bueno. Mas a transmissão de Fórmula 1 aqui da Alemanha é uma coisa de outro mundo. Um mundo em que a gente sonha poder ouvir o famoso "Bem amigos da rede Globo..."

Pra começar, tem a tietagem dos repórteres e comentaristas. Se os do Brasil (mais precisamente os da Globo, mesmo) gostam de se gabar de que são íntimos dos esportistas famosos e que tem uma espécie de acesso VIP a eles, os daqui tietam na maior cara-de-pau. E, com seis pilotos alemães na temporada atual de F1, eles são capazes de passar mais de meia hora falando e entrevistando (antes da corrida) só os representantes nacionais no esporte. Na primeira corrida deste ano, eu fiquei assistindo enquanto um repórter vestido com um paletó ultra-colorido (!) pulava de carro em carro, já no grid de largada, entrevistando (ou tentando) os pilotos alemães. De um por um. Tive vários momentos "vergonha alheia", já que o pobre repórter invariavelmente ficava no vácuo, porque obviamente os corredores já estavam concentrados para a corrida.

Depois, teve o fato de o Schumacher estar de volta à Fórmula 1. Gente, quanta puxação de saco! A cada 2 minutos eles davam um jeito de colocar o nome do Schumi na conversa. Parecia o Mr. Collins de Orgulho e Preconceito, que a toda e qualquer hora quer mencionar sua venerada Lady Catherine DeBourgh:

Estamos transmitindo o GP do Bahrein. Aqui vemos o campeão do ano passado, Jenson Button, mas sabem quem está aqui hoje? Michael Schumacher! Ele volta hoje à Fórmula 1. Ah, ali está o Felipe Massa. E o Fernando Alonso, bicampeão da Fórmula 1. Os dois correm pela Ferrari. Sabem quem corria pela Ferrari e foi campeão 7 vezes? Michael Schumacher!! E ali está a mãe do Lewis Hamilton. Dizem que ela faz bolinhos deliciosos. E sabem quem adora bolinhos? Ele mesmo, Michael Schumacher!!!!!!

E uma outra coisa que me deixou pasma. Estávamos assistindo à corrida e, do nada, entra um comercial! Não um comercial daqueles em que um narrador lê uma vinhetinha e aparece uma animação rápida na tela, por cima da imagem da corrida. Não, foi uma propaganda completa e vitaminada, que durou nada mais, nada menos do que 7 minutos! Eu contei! Eu não podia acreditar no que estava vendo. Num esporte como a Fórmula 1 - aliás, em qualquer esporte - , em que as coisas podem mudar muito rápido, é um crime fazer uma propaganda dessas, por menor que seja. Eu só sei que, quando voltou, tínhamos perdido umas cinco voltas e a posição dos pilotos na corrida já estava completamente diferente. Não satisfeitos, claro, essas megapropagandas se repetiram outras duas vezes durante a transmissão.

E a narração durante a corrida? O bicho está pegando lá na frente, com três pilotos disputando posições, e a TV alemã fica mostrando a rodadinha que o Schumacher deu lá atrás, no décimo lugar. Não só mostrando, como repetindo de três ângulos diferentes. Eles também lamentam o tempo todo sobre cada alemão que teve que abandonar a corrida. O engraçado é o tom de voz. Eles dizem algo como "Ah, mas que pena que o Vettel teve que sair!" Quase posso ouvi-los dizendo "Eu estava torcendo tanto por ele! Ah, nem! Que raiva, sô!"

Tá bom, eu sei. Eu já tô começando a implicar. Transmissão brasileira também é super tiete com os brazucas. Mas é que eu fiquei brava mesmo foi com a propaganda de 7 minutos. No dia seguinte perguntei à professora se era assim também na Copa do Mundo, e ela disse que no máximo eram comerciais de 30 segundos. Ufa!

Só em uma coisa eles me ganharam. Quando apareceu o Bruno Senna, eles comentaram o fato dele ser sobrinho do Ayrton Senna, e falaram um tantinho de nada sobre o nosso querido e saudoso piloto. O fato dos comentaristas conhecerem e falarem sobre o Senna devolveu um pouquinho do meu respeito por eles. Mas só um pouquinho. Até o próximo intervalo de 7 minutos. ¬¬

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Volta às aulas

Nada como um caderno de Nárnia para alegrar as aulas!

Tirei a poeira do dicionário, busquei livros em armários e empunhei caderno novo: voltei para a escola.

Eu sempre gostei do início do ano escolar. Era muito gostoso ter cadernos e livros novos, e se possível também mochila, estojo, lapiseira, borracha e caneta. O cheirinho das páginas recém-saídas das gráficas, do material novinho, do plástico que cobria as capas de cadernos e livros. Ah, como era gostoso! (Isso perdeu um pouco da graça na universidade, quando os professores não pediam livros, e sim textos da xerox - e todo universitário sabe que xerox é enjoada, lotada, cansativa e não tem cheirinho bom coisa nenhuma!)

Bem, semana passada começou o meu curso de alemão. Em janeiro de 2008, eu já havia feito o Módulo 1, apenas o comecinho desse mesmo curso. Agora vou fazer os seis módulos básicos, inclusive repetindo o primeiro. Não quis cair de pára-quedas no Módulo 2, preferi relembrar a matéria do começo e ter a gostosa sensação de entender tudo o que a professora fala. O curso é intensivo, e está previsto para terminar em abril do ano que vem.

A minha turminha é muito legal. Tenho dez amiguinhos, cada um de um país diferente, com exceção de duas russas que dividem a nacionalidade. Os outros países são Vietnã, Turquia, Romênia, Tailândia, Egito, Moldávia, Ucrânia e Espanha. O pessoal é simpático e mostrou entrosamento logo no primeiro dia, apesar de quase ninguém ter bagagem de alemão suficiente para realmente conversar. Nossa simpatia é transmitida uns aos outros através de sorrisos de encorajamento em sala de aula.

É muito interessante poder conhecer pessoas de outros países e culturas. Apesar de às vezes me acostumar com o fato de estar na Europa e cercada de gente de tudo que é canto do mundo, de vez em quando eu me forço a lembrar que essa é uma situação que eu tenho que aprender a valorizar. Uma das coisas que gosto de fazer é observar as personalidades de cada um e tentar isolá-las das idéias pré-concebidas que se tem em relação à nacionalidade dessa pessoa, porque todo mundo (e eu me incluo nessa) tem mania de colocar rótulos, e isso não é bom. Por exemplo, o pensamento geral aqui é de que os russos, que aqui tem aos montes, vêm para cá para "mamar nas tetas do Governo" e sempre tentam conseguir algo em proveito próprio. Porém uma das russas da minha turma não tem nada a ver com isso, é simpática e esforçada, e não parece ser do tipo que sempre gosta de ter vantagem em tudo. A romena é super agradável e gentil, o que vai contra o pensamento que temos de que todo europeu - ainda mais do Leste - é arredio. O turco é risonho, diferente da idéia que eu tinha de que eles sempre são sisudos e fechadões. O espanhol é engraçado e bastante disposto a entender o meu português, o que joga contra a antipatia que podemos sentir em relação aos agentes alfandegários que trabalham nos aeroportos da Espanha, não é mesmo?

E hoje, voltando para casa, eu vim ouvindo uma música que criou um momento digno de trilha sonora da minha vida: "O Caderno", do Toquinho. A música é muito fofa, e a parte da letra que eu mais gosto é aquela que diz assim: A vida se abrirá num feroz carrossel. Alguém pode dizer que não foi isso mesmo que aconteceu?

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Saudade é isso

Terça-feira, 19h50. Lá fora, o céu começa a escurecer. É finalzinho de verão, mas a estação já cedeu há muito tempo. Há alguns dias que faz frio; os casacos mais pesados saíram do armário, assim como as echarpes que fazem as vezes de cachecóis. Estamos naquela época do ano em que as janelas já não podem mais ficar abertas, mas ainda é cedo para ligar os aquecedores.

Geralmente, a esta hora, meu marido já chegou em casa. Hoje, ele vai ficar trabalhando até mais tarde. Janto, deito na cama um pouco e olho para o céu escurecido lá fora. As lembranças me invadem.

Minha memória pula para meus últimos dias no Brasil. Dia 1º de junho, onze dias antes do meu casamento, eu estava apenas com minha mãe e minha irmã em casa. A família ia começar a chegar no dia seguinte, logo seriam dezenas de pessoas pelos corredores, quartos, salas, banheiros, cozinha. Não haveria um lugar onde não estivesse alguém fazendo alguma coisa. Mas agora estamos só nós duas, eu e minha irmã, sentadas ali no quintal, no degrau da porta da sala de TV. O céu está igualmente escuro, algumas estrelas despontando, o dia chegando ao fim. Minha irmã se levanta e entra, eu fico ali. Me pego pensando, naquele instante, que é o meu último momento mais íntimo com a casa. Só nós e a casa onde passamos boa parte da infância e toda a adolescência.

Nos últimos meses, eu havia passado várias tardes sozinhas ali trabalhando, com minha mãe em Minas e a Nádia no trabalho. E eu gostava de estar assim. No final da tarde, a Nádia chegava, tomava café, nós colocávamos as conversas em dia e ela se arrumava e saía para a faculdade. Às vezes, quando ela não tinha aula, víamos um filme. Acho que aproveitamos pouco do que poderia ter sido.

Quando minha mãe estava em casa, ela ficava fazendo seus trabalhos manuais na sala, ou na sala de TV, ou mesmo na cozinha. Eu ia lá de vez em quando, para espairecer um pouco. Batíamos um papo, ela me contava alguma coisa que havia visto na TV ou que tinha acontecido recentemente. Quando meu pai também estava em casa, um deles fazia café lá pelas quatro da tarde e levava uma xícara para o outro, às vezes acompanhada de um pão francês ou de uma fatia de queijo Minas. Me dói pensar que é uma experiência que não vou ter mais como da minha casa. Agora, todas as vezes que eu presenciá-la, será uma cena isolada, na casa dos meus pais. Ela não é mais minha, é deles.

Minha memória pula de novo, agora para a última vez que o David esteve em Niterói antes de vir para a Alemanha pela primeira vez, há dois anos. Ele me ajudou a mudar os móveis do meu quarto de lugar, e depois me ajudou a arrumar tudo, jogar coisas fora, colocar outras no lugar. Foi no último dia mesmo. No dia seguinte, ele viajou para Santos e, alguns dias depois, de São Paulo para Frankfurt, trazendo um pedação do meu coração com ele.

Mudanças têm esse poder de imprimir imagens, cheiros e ruídos em nossa memória. Posso fechar os olhos e me imaginar na casa dos meus pais, neste mesmo horário: o cachorro do vizinho latindo, minha mãe cantando enquanto se arruma para o ensaio, meu pai esquentando o jantar no microondas enquanto vê jornal na TV da cozinha, meus sobrinhos brincando, cigarras e grilos cantando lá fora, talvez o som do meu próprio teclado do computador.

Também consigo me lembrar fácil de outros marcos na minha vida: estranheza saindo de Niterói em 1989 e chegando em São Luís em seguida; memórias de viagens diversas; saudade me despedindo da minha irmã que foi para o seminário em 1991; saudade de mais uma vez me despedindo da outra irmã que casou e foi morar fora em 2001; nostalgia e nó na garganta abraçando amigos no meu casamento; surpresa, novidade e cansaço chegando na nossa casa nova na Alemanha. Partidas, chegadas, mudanças.

É tudo muito melancólico, eu sei, mas também é muito bom. A saudade é gostosa, faz a gente lembrar do que a gente ama e valoriza. Momentos preciosos que não voltam mais, e que por isso mesmo têm um lugar muito especial no coração. Muitas vezes não percebemos a importância deles enquanto acontecem, mas em algumas poucas ocasiões temos essa sorte. E, naquele 1º de junho, eu pude desfrutar do meu último cair da noite, a sós com a nossa casa.